Temporada 3
Episódio 8 –
Confiável, Legal, Sexy
Trilha inicial deste episódio: https://www.youtube.com/watch?v=qi7Yh16dA0w
Três semanas haviam se passado.
Nesse tempo, as histórias avançaram na velocidade do melhor
provedor de internet que Bia e Marcela podiam ter.
E isso era ótimo.
As duas estavam vivendo situações que funcionavam como se
fossem um sopro de vento em dia de calor torturante.
Depois de tanto contratempo afetivo, enfim momentos para
respirar.
Era a mesma sensação de um torrent que havia parado em 99%
há dias e voltava a baixar o arquivo de repente.
Era uma sensação muito mais incrível do que 500 match
seguidos no Tinder.
Muito mais empolgante do que receber notificação e não ser
de convite para jogo no Facebook.
***
Nessas semanas, Marcela contou os dias.
Não os que passavam, mas os que faltavam.
Porque estava cogitando conhecer o barbudo que morava do
outro lado da telinha do seu computador.
O homem que, de tanto conversar, aparecia no topo da sua
lista de contatos no chat do Facebook.
Marcela precisava ser franca com ela mesma às vezes, e
buscar um pouco de frieza para avaliar o que fazer.
Não era mais criança, e nem era uma mulher iludida.
Mas olhava as fotos e as mensagens dele e todas as suas
certezas de mulher madura e consciente caíam mais que o seu sinal de internet
em dia de chuvarada.
Não que estivesse pesquisando vestido de noiva e afins,
apenas queria desfrutar daquele momento de reciprocidade.
O quanto iria durar? Nenhum deles sabia.
Aliás, esse foi um dos tópicos de algumas conversas que
tiveram. Entre tantos papos, a possibilidade de se gostarem e de ver no que
isso ia resultar acabava entrando em pauta.
- Tento não pensar nisso, mas se nos encontrarmos mesmo, já
penso em como vai ser a hora de ir embora.
Falava ele, seguido por um emoticon triste.
Marcela respondia com outro emoticon triste.
:(
E ele falava, sempre:
- Não vamos pensar nisso.
Mas Marcela pensava.
Porque gostava de esgotar as possibilidades, boas e ruins,
mesmo que fossem apenas suposições.
Nelas, eles se curtiam ao vivo.
Mas também não se curtiam.
Nelas, eles se curtiam, ficavam juntos e depois se tornavam
amigos.
Nelas, eles viviam uma história mais consistente.
Nelas, eles nem chegavam a se conhecer.
Afinal, Marcela sabia que havia uma distância enorme. Uma
distância apenas geográfica, porque de resto, eram como se fossem vizinhos.
Moradores de um mesmo andar, que batem na porta um do outro para pedir açúcar.
Marcela sabia que a distância podia desgastar o interesse, e
por isso “ameaçava” a sorte do moço com a boca do sapo costurada.
- Um dia – contou ele – um astrólogo disse que eu iria
encontrar um amor num período que antecede qualquer possibilidade de nos
vermos.
- Ah é? Pois desde já vou costurar o nome dele na boca do
sapo. E você vai ficar sozinho.
E assim brincavam.
E assim, passaram as semanas.
Vinte e um dias em que nunca, em todo o seu tempo de redes
sociais, usou tantas vezes os símbolos:
:3
(coração)
***
Bia e Gabriel encontraram-se novamente naquele intervalo de
tempo.
Em outro bar.
Foi um encontro com o objetivo de aprofundar fatos da vida
um do outro. Além, claro, da inevitável troca de beijos.
Gabriel relevou detalhes da sua vida, era o tipo de coisa
que só acontece quando se tem intimidade e confiança.
Bia sentiu-se recompensada por isso.
Entre tantos fatos, Bia concluiu que Gabriel havia passado
por muita coisa difícil na vida. Até sentiu-se mal por todas as vezes que
reclamou sem um motivo realmente verdadeiro.
As suas reclamações, nos últimos tempos, eram em função de
problema com homem.
Seja pela falta, seja pela qualidade ruim dos que apareciam.
- Vamos pedir cerveja?
Perguntou Gabriel.
E assim, a cerveja e os beijos eram os únicos motivos que o
faziam parar de conversar, de contar alguma história que envolvia familiares ou
os seus melhores amigos.
Bia gostava de conhecer aquelas histórias, pois sentia-se
parte de alguma coisa.
Afinal, não era todo mundo que compartilhava histórias tão
importantes com alguém que ainda não conhece direito.
Com exceção das senhorinhas na rua que contavam qualquer
coisa para o primeiro estranho que aparecesse e que tivesse paciência para
escutar.
***
Desde que a notícia de que o Orkut iria suspender suas
operações definitivamente foi publicada, semanas antes, as meninas mergulharam
num mar de nostalgia sem fim.
Sim, suas contas ainda existiam, embora inseridas num limbo muito
profundo.
Deep web.
E só hoje Bia resolveu abrir o seu antigo perfil; sua
primeira experiência nas redes sociais, e vasculhar um passado que nem sempre
foi bom.
Foi lá que aconteceram suas primeiras experiências efetivas
de relacionamento virtual. No sentido de flertar, trocar mensagens.
Mas foi lá, também, que teve um namoro de verdade. Relâmpago,
mas teve.
Com mudança de status, fotos e tudo o mais.
Abriu a página inicial e conferiu as visitas recentes. Ainda
tinha gente visitando seu perfil.
Os milhares de scraps animados ainda estavam lá.
As fotos do tempo que era feia e não sabia. E ninguém teve a
decência de lhe avisar.
Apagou todas.
Olhando aquela página, percebeu que com a sua extinção iria
com ela todas as suas cotações de confiável, legal e sexy. Não que acreditasse
muito nelas.
Mas também iria embora uma série de desgostos amorosos,
essas paixonites que desde aquela época nunca chegaram a acontecer.
Quantos recados secretos deixou por depoimento e os cretinos
aceitaram só para zuar.
Quantos scraps enviados, e jamais respondidos.
Quantos convites de amizade negados.
Não fez questão de salvar nenhuma informação.
E olhando os vídeos que publicava, achou um que a fez
lembrar o quanto a sua vida amorosa tinha sido cagada por ser real demais: https://www.youtube.com/watch?v=uy0HNWto0UY
Bia sentiu-se um pouco #chatiada ao lembrar-se daquela
época.
E enquanto se preparava para abandonar de vez a sua conta,
uma mensagem na outra aba pediu sua atenção.
Era Gabriel.
De todo aquele passado, lamentou apenas por ter acreditado,
sempre, na maldita sorte do dia.
E colocou pra tocar uma canção que embalava suas amarguras: https://www.youtube.com/watch?v=NJWIbIe0N90
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