O
decorrer dos dias entre uma sessão e outra só foi possível de aguentar por
conta das muitas xícaras de café que ela tomou.
Ela
respondeu a mensagem do homem perfeito. Disse que aceitava sim, mas precisava
de uns dias pra acalmar a situação no trabalho. Ele concordou, aparentemente
animado.
Porem
a verdade era que só queria adiar aquele encontro. O máximo que pudesse.
E
percebeu que era de fato um relógio com a pilha fraca. Estava quase emudecendo
o seu tic tac no fundo de uma gaveta.
Diria
isso durante a terapia.
“Nossa
como estou falante”, pensou.
Estava
sentada na salinha de espera branca olhando os quadros de pintores famosos reproduzidos
na parede e com a sensação de que pudesse ser, talvez, um caso perdido. Talvez
nunca fosse receber alta.
-
Ele está lhe aguardando, pode entrar.
Falou
a senhorinha recepcionista.
E
entrou. Ele, claro, com a mesma camisa xadrez colorida.
Desligou
o celular e sentou-se. E diferentemente dos outros dias, desatou a falar.
Contou sobre o que respondeu na mensagem. Ele olhando-a fixamente, parando de
vez em quando para escrever no seu bloquinho.
-
Por que, ao invés de adiar o encontro, você não cancelou de vez? Não seria mais
prático para você?
Disse
ele.
E
ela não soube responder.
Imaginou
novamente que fosse o caso do relógio. Escondida, porém querendo ser notada.
Comentou
que havia falando sobre isso com as amigas, e que toas diziam que deveria estar
louca, o tal homem era incrível, maravilhoso e etc, que havia perdido a noção
das coisas.
-
Acho que todas elas tem razão.
Ela
disse, soltando um suspiro infantil, desses que estremece as bochechas.
-
Pois não existe razão. O que acontece é que as pessoas vivem numa ditadura da
razão, como se existisse um padrão de comportamento. Tem gente que é um relógio
de pulso, tem gente que é um relógio de parede, tem gente que é um relógio de
celular. Todos trabalham e atuam de formas diferentes.
-
Mas com um objetivo igual. Isso não seria um padrão?
Ela
o questionou. E isso o incomodou um
pouco.
-
Sim. Por um objetivo igual, mas nunca de forma igual.
E
ela ficou pensando. Sendo assim, não era louca como as amigas disseram. Medrosa
sim, mas louca não.
E
isso a deixou aliviada. Um problema a menos para resolver.
E
chegou o momento de silêncio. Aproveitou para relembrar do homem. Tão lindo...
teve vontade de ligar pra ele ali mesmo, mas a imagem das câmeras sendo
reveladas novamente lhe veio na mente e ficou paralisada.
Ele
percebeu sua angústia, pois anotou coisas freneticamente no bloco.
Ficou
preocupada.
De
repente, era como se sua vida pudesse ser retratada em simples traços num bloco
de terapeuta. Tão vazia que poucas folhinhas seriam o suficiente.
“Queria
poder preencher mais algumas folhas.”
P.S.:
Obra ficcional. O objetivo não é proporcionar nenhum tipo de diagnóstico. Em
casos de algum problema, procure um profissional habilitado.
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