Ela acreditava que um dia seria merecedora da tal felicidade
novelística.
Mas ela cresceu e viu que a vida é feita, mesmo, dos
bastidores. Pequenos acidentes, más intenções, enganos, ilusões, promessas. Um
mundo ficcional revelado.
Sempre haveria as chamadas gentes de bem, por mais que odiasse
essa expressão. Mas elas existiam. Só
não tinha tido a sorte de esbarrar com alguma, como quem tropeça com uma pedra
e a chuta. Porque é mais fácil acreditar que todos os tropeços são em pedras
insignificantes.
Um dia caminhando pela rua uma cigana parou para ler a sua
mão. Nunca acreditou nessas clarividências. Mentira, acreditava sim.
Tanto é que não hesitou nem por um segundo em estender sua
mãozinha branca cheia de estradas gravadas na palma para a mulher.
“Cigana Esmeralda”, disse. “Me chamo assim.”
A velha, vestida com indumentárias que pareciam retiradas de
um armário de figurinos da televisão, olhou para os caminhos que se transpassavam,
olhou para ela e olhou para a mão de novo.
E disse, como se jogasse uma daquelas pedras na sua cabeça.
- Você nunca será feliz por gostar de homens.
Mas o que ela queria, que fosse lésbica? E afinal, pra ser
feliz, tudo se resumia em homens?
E o mais triste foi perceber, naquele momento, que sim, estava
mais preocupada com sua evolução afetiva, parecendo intelectualmente infectada
por alguma coisa que inibisse sua capacidade de avaliar a importância das
coisas.
A cigana largou a sua mão e ela caminhou pelo centro da cidade
meio vazia. Não era fome. Era uma tristeza, uma descrença que não podia
expressar verbalmente. E mais do que tudo, um sentimento de imbecilidade por
acreditar tanto em uma andarilha.
Lá atrás, enquanto ela se afastava, a velha retirava o colar
de pingentes dourados que havia prendido nos cabelos, os panos vermelhos e
guardava tudo em uma bolsa. Mais um dia de trabalho ficava para trás. Afinal,
era uma cigana tão verdadeira quanto uma nota de três reais. Seu negócio tinha
como produto a ilusão.
Seu nome? Um nome comum. Maria da Conceição.
2/9/2015
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