No capítulo anterior...
Rosaura se entrega ao amor de Leandro. Encantada com as novidades do amor, a digníssima senhora chega em casa com a alma levíssima, quando é surpreendida pela notícia da morte do marido.
Capítulo 6
Rosaura pareceu entrar num estado de transe. Não conseguia acreditar naquela atrocidade. Como seu marido podia estar morto? Como? Ainda naquele dia ele estava vivo, vivinho da silva. Alguém, que nunca se lembrou quem era, veio lhe despertar do transe:
- D. Rosaura, D. Rosaura!!
- Hã?
- O delegado quer falar coma senhora!!
Só então Rosaura conseguiu cair num pranto que parecia não ter mais fim. Houve quem achasse que ela teria um colapso. Menos o chofer, que pensava recolhido em seu silêncio habitual:
- Vagabunda...
O delegado Rodrigo Miranda ia interrogar a viúva, mas diante do pranto de louca da mulher, que chegava a lhe chacoalhar o corpo todo, falou para um dos empregados que voltaria mais tarde. Foi preciso que dois empregados fortes amparassem e carregassem Rosaura para dentro de casa. Os vizinhos assistiam ao espetáculo atônitos, num misto de curiosidade cruel e compaixão. De vez em quando, o pranto de Rosaura saía sem som algum, apenas seu corpo se encurvava sucessivamente com o choro silencioso, mas logo depois voltava com tudo. Assim que conseguiram colocá-la na cama, deram-lhe um calmante poderosíssimo e, em pouco tempo, sua tristeza escondia-se dentro de um sono profundo. Dias depois, Rosaura poderia constatar que sua crise de desespero não era exatamente tristeza, mas sim um grande e corrosivo remorso, pois, naquele mesmo dia, enquanto o marido era morto, voltava para casa melecada pela gosma da infidelidade. E a escuridão do sono induzido roubou até mesmo seus sonhos, estava mergulhada no nada. E assim ficou por horas e horas.
Leia os capítulos anteriores:
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Já passava da meia-noite quando acordou. Primeiramente achou ter sonhado com tudo, mas a sua dor de cabeça e a imagem de Leandro nú em sua memória recente lhe atacaram com a foice da realidade. Chorou umas lágrimas amargas, dignas de um arrependimento cruel. A criadinha, que velava seu sono, chorava de tristeza ao seu lado, dizendo:
- D. Rosa... D. Rosaura, o Dr. Alberto acabou de chegar, liberaram o corpo para o velório, D. Rosaura. A senhora precisa tomar um banho e se trocar...
Então, ajudou-a a tomar um breve banho de banheira, só para tirar a poeira do corpo, mas a criadinha não sabia que havia muito mais do que poeira para ser lavado. A seguir, Rosaura escolheu um vestido preto, discreto como toda viúva deve ser, e desceram as escadas. Por estar ligeiramente tonta, Dr. Alberto amparou-a e a conduziu para o carro, iriam juntos ao cemitério. Não chorava mais. Agora permanecia num silêncio que incomodava Dr. Alberto. Ela pensava, agora, em como aquilo poderia ter acontecido. Isso que ainda não sabia que o marido fora assassinado: um tiro certeiro na cabeça e diversas punhaladas. Iria dizer que não podia ser, que o marido não tinha inimigos, era uma pessoa muita querida pela sociedade sulista inteira, mas logo iriam surgir suspeitos em sua mente. Momentos depois, o carro entrou no Cemitério Parque. Quando desceu, já restabelecida da tontura, a primeira pessoa que viu foi ele, a única que não queria ver: Leandro. Em meio ao seu estado por causa da morte inesperada do marido, ainda teve tempo de pensar o quanto ele estava belo em seu traje escuro. Sacudiu os pensamentos e foi falar com ele, xingá-lo, escorraçá-lo de sua vida. Mas não fez nada disso.
Ela disse, após pedir licença para o Dr. Alberto:
- O que faz aqui?
- Vim só para vê-la. Quero dizer, admirava seu marido, mas só você me interessa.
- Você está louco, louco...
E ele completou a lacuna, como naqueles exercícios de colégio:
- Por você, Rosaura.
Nisso, João chegava com o resto dos empregados, e Rosaura sentiu toda a frieza e indiferença estampados no olhar do homem. Só então percebeu que as pessoas estavam desconfiando de alguma coisa.
- Leandro, me deixe, está ouvindo? Está acabando com minha vida.
- Nunca! Nem morto!
- Pare com isso, pelo amor de Deus!
- Faria qualquer coisa para ficar contigo, está me entendendo? Qualquer coisa! Qualquer coisa!
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Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
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