terça-feira, 24 de junho de 2014

Amores WI-FI - Temporada 3 Episódio 2: O Mundo Encantado de Ícaro




Temporada 3
Episódio 2 – O mundo encantado de Ícaro



Bia estava escolhendo o que usar no date que havia marcado pelo Tinder para o domingo.
Não havia combinado nada de mais com o tal fulano.
“Vamos almoçar?”, disse o rapaz, chamado Daniel.
“Tá”, respondeu.
Agora estava assim: sem criar expectativas. Porém, mais cedo ou mais tarde iria criar, era só o tempo de achar alguém que falasse meia dúzia de palavras gentis.
Não era carência, exatamente. Bem, talvez fosse.
O que importa é que estava tranquila.
Optou por uma blusa que fazia a linha romântica, nada de look provocante sensual dessa vez.
Fazia um tempinho que Bia não marcava date, por isso estava sentindo-se triunfante.
O moço havia adicionado Bia no Facebook também, e achou que já tinha um pouco mais de intimidade.
Daniel parecia ser um cara correto. Fotos em família, posts com discursos bem escritos, opiniões interessantes. Ao menos superficialmente, era alguém que despertava seu interesse. Por isso não relutou em marcar o date em um local próximo, numa galeria que achava charmosíssima.
Jogou perfume no ar e cruzou aquele jato cheiroso num rodopio. Verificou sua bolsinha e se foi.
Estava confiante novamente.

***

Apesar de ser domingo Marcela estava trabalhando, mas apenas pela manhã. Era necessário. O que a motivou foi o fato de ter marcado encontro com Ícaro após o almoço para um passeio pela cidade.
Ícaro.
Soltou um risinho besta enquanto caminhava pela rua até o local onde marcaram, perto do seu trabalho.
Lá estava ele do outro lado da rua. Camiseta branca e jeans escuro. E aquele cabelo levemente desgrenhado.
Ele a cumprimentou com um beijo, do tipo de gente que já tem intimidade além de uma única noite.
“Mas já somos íntimos de certa forma”, pensou Marcela, afinal, na saída da boate, Marcela pagou um queijo quente para Ícaro, que havia perdido dinheiro na pista.
Ícaro contou que comeu sorvete enquanto a esperava, andou pelas redondezas, e que queria sentar-se no parque.
Ícaro falava muito sobre sua vida, sobre seus estudos, sobre o conceito de arte dos monumentos que via pelo caminho do parque, os quais Marcela mal reparava de tão anestesiada que estava com a rotina.
Sentiu-se mal por isso.
Parava para observar o rapaz, e ficava muda. E por não saber o que falar, o beijava.
De certa forma, tanta sede de viver a deixou um pouco intimidada, porque percebeu que tinha se acomodado um pouco ao longo dos anos.
- Você tem um sonho, Marcela?
Perguntou Ícaro.
E não soube o que dizer.
Onde foram parar seus sonhos? Em que momento da vida esqueceu que precisava tê-los?
Apesar de ficar desconcertada, estava ainda mais deslumbrada com Ícaro. Porque, entre outras coisas, ele despertava vontades e sentimentos que há muito Marcela nem lembrava que existiam.

***

Bia chegou na galeria onde combinou com Daniel. Estava com um pouco de frio, mas ficou sentada na parte externa mesmo assim.
Tirou da bolsa um livro qualquer, era uma tática que usava para não parecer ansiosa demais quando o pretendente chegasse.
Claro que ela chegou bem antes, gostava de chegar primeiro.
Pediu um cafezinho simples para não ficar ocupando lugar nas mesas sem motivo.
Tentava ler o livro, mas não conseguia se concentrar. Mas fingiu estar lendo.
Ficou na mesma página por um tempo bem maior do que ficaria em outra situação.
Passou meia hora, e já era tempo o suficiente para Daniel chegar, pois, segundo ele, morava perto. E já havia passado há muito do tempo aceitável para o atraso.
Já estava ficando puta.
Mandou uma sms, porque estava sem crédito suficiente para usar 3G, o qual não tinha plano, e não tinha wi-fi disponível naquele lugar.
Aliás, iria se lembrar de reclamar mais tarde por um lugar tão frequentado não ter wi-fi.
A sms pareceu ser ignorada.
Já havia avançado algumas páginas do livro, bebido todo o cafezinho e até comido o biscoitinho que acompanha, bebeu também o copinho de água, e nada de Daniel.
Oficialmente havia levado bolo.
“Mas que caralho!!”, pensou.
Pagou a conta, recolheu seu livro e foi embora, com a certeza de que o frio que pegou iria lhe causar cistite.
Mais tarde iria descobrir que Daniel havia lhe bloqueado no Facebook.

***

Ícaro quis assistir um filme com Marcela, e pagou sua entrada. Sugeriu um que viu em cartaz no centro cultural do centro da cidade. E lá se foram.
Chegaram um pouco cedo demais, e deu tempo de visitar uma exposição antes. Andavam de mãos dadas.
Ícaro comentava sobre as obras. Uma das fotografias mostrava uma geladeira antiga aberta, uma geladeira igual a que tinha na casa de Marcela na infância.
Ícaro roubou um beijo.
Haviam perdido um pouco da noção do tempo, e quando chegaram na sala de projeção, o filme já estava nos créditos iniciais.
A história não podia ser melhor metáfora para o seu dia. Contava a vida de uma moça com 27 anos e ainda perdida no que queria fazer da vida. As coisas não davam certo, era preciso encontrar uma nova saída, sonhar mais.
“Mas que saída vou achar pra mim?”, pensou rapidamente.
O mais difícil seria achar um sonho.
Marcela era péssima em sonhos.
Quando o filme acabou, ainda era dia.
Marcela resolveu levar Ícaro para ver o pôr do sol. Precisaram correr, porque já já ficaria escuro. Porém, se perderam no interior do prédio e não acharam a saída correta. Já estava noite.
- Desculpe.
Disse Marcela.
- Não tem problema.
Respondeu ele, enquanto corria segurando Marcela pela mão e parando apenas para beijá-la.
Quando chegaram na rua resolveram que deviam jantar.
Vamos pegar outro caminho? Disse Ícaro.
Marcela não estava acostumada a mudar seus caminhos.
Passaram por um boteco de samba que Marcela nunca tinha ouvido falar.
Beberam cerveja e admiraram uma senhora dançar.
Sambaram meia hora em cada esquina.
E depois de comer cachorro-quente em uma padaria barata, terminaram a noite conversando e olhando as estrelas na sacada dos fundos no hotel de Ícaro.
A vista era formada apenas por telhados alheios, conversas em volume alto vindas da vizinhança e gatos perdidos.

Marcela precisava sonhar mais. Porém, aquele já era um bom início. 

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