Trilha inicial: https://www.youtube.com/watch?v=2eUTR4UGwZ4
“Eu tinha um lado doce. Mas as formigas levaram embora.”
Constatou Bia, ao se olhar no espelho do banheiro. “A solidão me fez roqueira?”, não, “a solidão me fez dura”. Era esse o preço que pagava por ter sido uma mulher amorosa com quem não merecia.
Sim, Bia acordou dramática. Mas uma coisa era verdade: nada melhor que o tempo... para fazer a poeira baixar, mas em alguns casos, torná-la ainda mais densa. Suja. Inconveniente. Deixando a vida insalubre.
Era assim que ela se sentia às vezes. No meio de uma tempestade de poeira das feridas ainda não fechadas.
A história com Gabriel ainda era (e provavelmente seria por muito tempo) aquele tipo de machucado que, de vez em quando, a gente arranca a casquinha mesmo sabendo que vai sangrar. Mas o pior já havia passado.
Sem encontrar explicação, era agora uma mulher muito mais confiante, e havia provado experiências novas, havia conhecido novos rapazes. Sentia que fazia mais sucesso, por consequência.
Mas continuava sozinha.
“Ok, um passo de cada vez”. Pesou, enquanto saía do banho naquela manhã de início de dezembro.
Podia já sentir o clima de Natal invadindo sua casa, entrando no seu corpo, e detestava isso. Detestava final de ano. E percebeu que estava com o humor ruim demais, mesmo para uma segunda-feira.
Secou o cabelo e ele ficou lindo. Bastou pra ficar melhor. Coisas de mulher.
Estava tomando o café da manhã na cozinha quando percebeu que Marcela, atrasada, ainda dormia.
- MARCELAAAAAAAAAAAAAAAAAA!!!
Bia não tinha como saber, mas naquele momento Marcela sonhava. Sonhava com fatos que já haviam passado. Pequenas e doces memórias guardadas, reativadas de forma muito lúcida.
Deu de ombros.
Bebericava em uma xícara o seu café sem açúcar e rolava a timeline do Twitter pelo celular.
As torradas aguardavam o ponto na sanduicheira.
Naquele horário os tuites dividiam-se em: “bom dia”, “não consigo sair da cama”, “nossa que calor” e “queria estar morta”.
Resolveu olhar as suas DMs, e para sua surpresa, o app havia resgatado praticamente todas as mensagens que recebeu nos últimos quatro anos. Rolar aquela quantidade toda lhe deixou estarrecida.
Era como um pequeno histórico de sua vida amorosa virtual recente. Sua fracassada vida amorosa.
Havia muita troca de mensagem com amigos, assuntos pontuais que precisavam ser abordados (e não diante de todos). Mas a maioria apontava pequenos flertes, e até alguns mais intensos.
Entre aquela série de crushs arquivados, havia um que lhe deixava um pouco #chatiada. Era um moço que conheceu pelo próprio Twitter. Jovem, lindo, divertido, lhe achava bonita. Bia adorava cada vez que ele o chamava de bonita, ou tesuda.
Naturalmente era um caso padrão.
Por um dia, dois, talvez até semanas, a conversa flui como mágica. A euforia, a identificação, os mesmos gostos musicais, as promessas de um dia conhecerem a cidade um do outro.
Até que tudo morre numa DM não respondida e esquecida. E lá estava a DM não respondida do tal jovem. Fechou o app.
As torradas já estavam prontas na sanduicheira.
E parecia que a sua vida amorosa jamais chegaria no ponto.
***
Enquanto isso, Marcela sonhava.
As imagens do seu subconsciente lhe mostraram, como em um filme ininterrupto, sem nenhunzinho comercial, tipo as gravações que fazia no VHS, a sua viagem para conhecer ele.
O barbudo.
E como todo sonho cinematográfico que se preze, o seu tinha uma trilha sonora: https://www.youtube.com/watch?v=GSdN0KXJJKc
Marcela se viu nos sonhos desde o momento em que desembarcou no aeroporto. Viu a bagagem na esteira lutando com outras malas que ficaram trancadas no dispositivo.
Viu quando chegou no hotel, um tanto nervosa, pois naquela mesma noite iria encontrar o homem que por meses conversou, conheceu gostos, incertezas e desejos. O homem que lhe inspirou, secretamente, até mesmo algumas linhas de texto, hábito que há muito não dedicava alguns momentos.
E nunca ninguém soube disso.
Viu quando foi almoçar. Não estava muito frio na rua. No sonho, pôde sentir a temperatura perfeitamente.
Comeu um sanduiche e voltou para o hotel, precisava escolher a roupa e carregar o celular.
Nesse meio tempo falaram por Whatsapp.
Combinaram que ele a pegaria perto de uma estação de metrô. Marcela sabia qual era, ficava num ponto de fácil acesso.
A noite chegava.
O sonho avançava.
Marcela reparou que havia ficado frio, o que prejudicaria qualquer tentativa de sensualizar usando algo que não a cobrisse por inteiro. Mas teria que usar casaco.
Colocou os fones no seu celular e foi escutando música pelo caminho para relaxar.
“E se ele mudasse de ideia? E se ele me visse de longe e acelerasse o carro, me achando um raio de tão feia? E se desparecesse?”
Pensou em muitas coisas durante o caminho. Ainda estava insegura, até porque o ritmo das conversas havia diminuído nas semanas anteriores. “Mas tudo bem, já que estou aqui, vou deixar rolar”, pensou.
Fazia um pouco mais de frio. A avenida estava muito movimentada. Músicos amadores, adolescentes, senhoras apressadas. Mas ela certamente era a mais adolescente de todos que por ali passavam.
Estava nervosíssima.
Ficou parada perto do meio fio para facilitar, para que o barbudo lhe visse mais rapidamente. Guardou os fones de ouvido. Pouco depois, ele chegou. Viu sua cara barbuda fazendo sinal.
“Meu Deus.”
Pensou Marcela, enquanto entrava no carro, formulando algo para dizer.
Eles se cumprimentaram levemente, despidos daquela intimidade virtual. Sentiu o seu perfume. Era estranho e divertido passar do virtual e observar outros aspectos.
Era engraçado, também, um sonho conter tantos e fiéis detalhes. Era realmente um filme que havia sido colocado novamente para rodar.
Trocaram rapidamente algumas ideias sobre onde jantar. Para Marcela não faria diferença, pois qualquer lugar seria novidade. Mesmo assim fez questão de pontuar: “não como comida crua”.
Lugar decidido, foram até a casa do barbudo apenas para deixar o carro e pegar um táxi. A ocasião merecia um brinde alcoólico.
Marcela ainda estava nervosa. Era como se estivesse falando com o barbudo pela primeira vez. Sentiu-se um pouco besta. “Mas acho que é normal, uma rede social pode aproximar as pessoas, mas nunca vai gerar a intimidade que o convívio fora dela pode dar, então preciso de tempo”, pensou, tentando se convencer de que estava tudo certo.
O barbudo a levou em um restaurante com nome de animal, que ficava num prédio tipo cartão postal. Marcela já estava mais solta, e o vinho que ele pediu ajudou nesse processo.
Marcela de repente sentia-se como num típico filme de Sessão da Tarde. Um filme dentro do sonho.
Não havia melhor sensação do que perceber que os olhares se cruzavam, e se entendiam. Não era feito do vinho. Ao menos achou que não.
A garrafa terminou, era o momento de irem para casa. A casa do barbudo, naturalmente.
Atravessaram a rua escura de uma cidade que ainda estava agitada. Marcela sentiu medo de ser assaltada novamente. Mas estava com ele :3
Não demorou muito e já estavam no prédio. Era como se tivessem acelerado a sua fita VHS. Beijo no elevador.
Trocaram muitos beijos e abraços naquele sofá. Foram para o quarto.
Nesse momento Marcela acordou. Alguém pausou o filme.
- MARCELAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!!!!!!!
No exato momento do filme que Marcela ficava chateada de recordar/rever.
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Sim, a quarta temporada de Amores Wi-Fi chegou assim, de surpresa, igual ao álbum da Beyoncé. Mas talvez o resultado seja igual ao lançamento do álbum surpresa da Colbie Caillat
¯\_(ツ)_/¯
¯\_(ツ)_/¯
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