Trilha inicial: https://www.youtube.com/watch?v=ztO3Rjqxcho
Henrique mandou uma mensagem para Marcela no whatsapp, bem cedo.
Henrique: Che-guei Marcela!!
Marcela sentiu um frio percorrer seu corpo. Ficou nervosa,
era estranho conhecer alguém ao vivo depois de uma certa intimidade virtual.
Não era como se fossem apenas se rever, sensação esperada entre quem muito já conversou.
Era como um novo processo. Iriam se conhecer do zero, foi assim que se sentiu.
Chovia torrencialmente. Marcela ficou de encontrá-lo para
almoçar, chegaria na recepção do hotel encharcada. “Meu Deus e se eu pegar uma
cistite”, pensou. E riu, sempre pensava nessas coisas.
Havia dado um trato no cabelo, mas no fim não gostou do
resultado, e sentiu-se feia. Não que esperasse alguma coisa de Henrique. Mentira,
esperava sim. Pelo menos um beijo na boca, ah se esperava isso!
O horário marcado se aproximava. Marcela sentiu dor de
barriga. Nem parecia mulher feita. Saiu da empresa a pé, mesmo chovendo o
equivalente a um dilúvio, pois era perto demais pra pegar táxi (que naquele
tempo horrível seria impossível conseguir de qualquer jeito).
Desceu uma lomba se equilibrando nos tênis All Star
escorregadios, enquanto segurava a enorme sombrinha e sua bolsa, agarrada no
peito para não molhar. Ficou ensaiando mentalmente coisas para dizer e parecer
descolada, mas tudo soava uma bosta.
Melhor nem tentar nada.
Dobrou a próxima esquina e avistou o hotelzinho de
janelinhas amarelas. “Me acode aqui Jesus, nunca te pedi nada!!”, implorou.
Tocou o interfone e uma voz com sotaque castelhano perguntou: “¿que quieres?”,
e Marcela enrolou a língua de nervosa “vim vê o hóspede Henrique”.
A portinha abriu, e se deu conta que o volume era alto o
suficiente para que quem estivesse na salinha escutasse sua fala cagada.
Inclusive Henrique, que a esperava, lindo, vestindo um casaquinho preto e calça
jeans.
A primeira reação foi abraçá-lo, e perguntar:
- Você não está com frio?
- Não, tô de boa!
Trocaram mais algumas palavras, ainda de forma mecânica, e
saíram para almoçar. Por conta da chuva decidiram ir num buffet de quilo ali
perto.
Escolheram uma mesa e foram se servir. Apesar da fome
Marcela não conseguiu comer muito, estava nervosa. “Meu Deus Henrique tem voz
de locutor de rádio”, pensava ela, já totalmente envolvida.
A única coisa que a tirou de seu estado de alucinação foi
mordedor. Enquanto ela aparentemente se derretia por Henrique, o seu ex caso
entrou no restaurante.
Ficou mais gelada, nível hipotermia. “Minha Nossa Senhora
dos Potinhos Não Devolvidos me ajuda!”
Ele finalmente olhou em sua direção e a cumprimentou, educadamente.
Vestia um blazer de veludo que o deixou muito bonito. Respondeu ao cumprimento
e o observou por uns segundos. Mas logo a voz de Henrique lhe devolveu para o
encanto inicial.
Não soube dizer se mordedor reparou no clima afetivo que se
encontrava em sua mesa. Na verdade, por enquanto apenas da parte dela, porque
Henrique estava agindo como um amigo. Mas mesmo assim sentiu-se envergonhada.
Olhou pela janela e a chuva havia parado.
- Que tal visitarmos alguns pontos turísticos no centro?
Trilha final: https://www.youtube.com/watch?v=hZdg5Uw8ZmA
E assim foram, a pé, desviando de poças de água.
Marcela já conhecia bem aquela sensação. Lembrou do príncipe
passageiro. Por isso evitou criar expectativas demais, por saber que em alguns
dias Henrique iria embora e ficaria na sofrência típica de quem apenas está
carente.
Porém era tarde. Sem admitir Marcela estava mesmo envolvida.
Não como quem está apaixonada, mas... não saberia dizer como.
Enquanto caminhavam, Marcela podia ouvir trilhas musicais
românticas em sua cabeça. Odiava quando isso acontecia. Mas também representava
um alívio – mesmo que passageiro – em seu histórico de gente que não presta.
Enquanto o céu parecia dar uma trégua na água derramada,
Marcela fingiu escutar o canto dos passarinhos, um arco-íris despontando nas
nuvens e borboletas voando ao seu redor. Sentiu vontade de segurar na mão de
Henrique, mas se contentou em apenas sentar-se do seu lado no ônibus e fingir
que ele não reparava nas mulheres bonitas que passavam por eles.
Apesar da tempestade, estava sendo um lindo dia.
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